Maria Isabel de Almeida - Professora da Faculdade de Educação da USP.
“Mas o que há assim de tão perigoso por as pessoas falarem,
qual o perigo dos discursos se multiplicarem indefinidamente?
Onde é que está o perigo?”
Michel Foucault
qual o perigo dos discursos se multiplicarem indefinidamente?
Onde é que está o perigo?”
Michel Foucault
A pergunta de Foucault é mais que procedente frente à situação vivida pelos professores das redes públicas de ensino, de quem é subtraído o direito de se pronunciar sobre o próprio trabalho. Com base no Estatuto dos Funcionários Públicos eles são proibidos de manifestarem publicamente suas opiniões a respeito de qualquer ato da Administração, por meio de entrevistas ou outros meios de divulgação.
Num franco desrespeito à Constituição, que garante a liberdade de expressão a todos os brasileiros, os professores não têm a possibilidade de exercitar o direito de crítica, de reflexão, de apreciação sobre o próprio trabalho e as circunstâncias que o delimitam.
O resultado dessa limitação “vinda de cima” é o silêncio! Mas que silêncio é esse? Onde está o perigo se os professores falarem sobre educação?
Não restam dúvidas de que esse silêncio é uma concepção de gestão da esfera pública que se sustenta em sanções e ameaças, que pairam sobre as cabeças docentes. Com isso o discurso dos professores sobre o seu fazer pedagógico está hoje preenchido de silêncio, o que evidencia o quanto eles não se sentem donos de suas ações. Cada dia mais lhes cabe executar diretrizes vindas de cima; implementar propostas que desconhecem; cumprir tarefas; focar a atenção em aspectos burocráticos em detrimento do estudo, da reflexão, da criatividade, do exercício da crítica. E ainda não lhes é permitido se pronunciarem publicamente a respeito do que estão realizando nas salas de aula ou mesmo sobre o que acontece na rede de ensino onde trabalham.
Falar sobre o ato de educar se faz indissociável do ato educador. Está associado à possibilidade e capacidade de problematizar e refletir sobre a própria ação docente e seus contextos. Expressa também relações de poder. Portanto, quando o poder instituído reserva aos professores apenas o espaço da ação e lhes nega o direito de formular sua própria proposta de trabalho e de expressar publicamente sua avaliação crítica sobre os modos e as condições que delimitam sua ação pedagógica, vem à tona o caráter autoritário dessas relações de poder.
Os professores não chegam prontos às escolas e nem permanecem nelas do mesmo modo ao longo de suas carreiras. Eles vão se construindo profissionalmente à medida que se relacionam com seus contextos de trabalho, com seus pares, com seus alunos, com as normas que delimitam sua profissão e sua atuação dentro dela. Portanto, as interferências e os atravessamentos dos órgãos coordenadores dos sistemas de ensino vão moldando os professores e têm enorme responsabilidade pela ausência da sua fala a respeito do trabalho realizado nas escolas.
Mas, além dos impedimentos formais, um outro lado desse silêncio o torna ainda mais grave. Trata-se dos efeitos decorrentes do modo como os professores vêm sendo considerados pelas políticas educacionais contemporâneas. As atitudes dos gestores dos nossos sistemas de ensino têm se pautado pela desqualificação dos professores
Num franco desrespeito à Constituição, que garante a liberdade de expressão a todos os brasileiros, os professores não têm a possibilidade de exercitar o direito de crítica, de reflexão, de apreciação sobre o próprio trabalho e as circunstâncias que o delimitam.
O resultado dessa limitação “vinda de cima” é o silêncio! Mas que silêncio é esse? Onde está o perigo se os professores falarem sobre educação?
Não restam dúvidas de que esse silêncio é uma concepção de gestão da esfera pública que se sustenta em sanções e ameaças, que pairam sobre as cabeças docentes. Com isso o discurso dos professores sobre o seu fazer pedagógico está hoje preenchido de silêncio, o que evidencia o quanto eles não se sentem donos de suas ações. Cada dia mais lhes cabe executar diretrizes vindas de cima; implementar propostas que desconhecem; cumprir tarefas; focar a atenção em aspectos burocráticos em detrimento do estudo, da reflexão, da criatividade, do exercício da crítica. E ainda não lhes é permitido se pronunciarem publicamente a respeito do que estão realizando nas salas de aula ou mesmo sobre o que acontece na rede de ensino onde trabalham.
Falar sobre o ato de educar se faz indissociável do ato educador. Está associado à possibilidade e capacidade de problematizar e refletir sobre a própria ação docente e seus contextos. Expressa também relações de poder. Portanto, quando o poder instituído reserva aos professores apenas o espaço da ação e lhes nega o direito de formular sua própria proposta de trabalho e de expressar publicamente sua avaliação crítica sobre os modos e as condições que delimitam sua ação pedagógica, vem à tona o caráter autoritário dessas relações de poder.
Os professores não chegam prontos às escolas e nem permanecem nelas do mesmo modo ao longo de suas carreiras. Eles vão se construindo profissionalmente à medida que se relacionam com seus contextos de trabalho, com seus pares, com seus alunos, com as normas que delimitam sua profissão e sua atuação dentro dela. Portanto, as interferências e os atravessamentos dos órgãos coordenadores dos sistemas de ensino vão moldando os professores e têm enorme responsabilidade pela ausência da sua fala a respeito do trabalho realizado nas escolas.
Mas, além dos impedimentos formais, um outro lado desse silêncio o torna ainda mais grave. Trata-se dos efeitos decorrentes do modo como os professores vêm sendo considerados pelas políticas educacionais contemporâneas. As atitudes dos gestores dos nossos sistemas de ensino têm se pautado pela desqualificação dos professores
A desqualificação do trabalho
As sucessivas mudanças introduzidas na organização e nos conteúdos da prática educativa trazem uma concepção a respeito do lugar e do papel dos professores no cenário educativo. Na medida em que lhes rouba a possibilidade de avaliarem e reorientarem o trabalho que realizam, impedem os professores de dizerem, com voz própria, como configuram e reconfiguram “os modos de ser professor” na escola pública contemporânea e de assumirem papel ativo na defesa do ensino.
Como a educação é um trabalho que se desenvolve entre humanos, depende do modo como os sujeitos diretamente envolvidos decidem fazê-la acontecer. Assim, os professores são os responsáveis pela direção que imprimem ao trabalho em sala de aula, momento em que escolhem os modos como será realizada a tão necessária ação para inserir os alunos no mundo do conhecimento, para introduzi-los nos mais variados aspectos da cultura, para possibilitar que cada indivíduo integre-se à humanidade. Um trabalho dessa natureza requer capacidade de julgar o que precisa ser feito, o que é possível fazer e como fazê-lo nas condições concretas em que se desenvolve na sala de aula.
Portanto, ao invés de amordaçar os professores e investir contra a autonomia docente, os gestores prestariam maior contribuição à melhora da escola pública se apoiassem o seu desenvolvimento profissional, fortalecendo seus vínculos com a escola, os alunos, a profissão. Isso significaria organizar o sistema e as escolas para que ofereçam possibilidade de estudo e experimentação pedagógica voltadas para a atualização constante das referências ou bases político-pedagógicas que sustentam os modos de atuação docente.
Como a educação é um trabalho que se desenvolve entre humanos, depende do modo como os sujeitos diretamente envolvidos decidem fazê-la acontecer. Assim, os professores são os responsáveis pela direção que imprimem ao trabalho em sala de aula, momento em que escolhem os modos como será realizada a tão necessária ação para inserir os alunos no mundo do conhecimento, para introduzi-los nos mais variados aspectos da cultura, para possibilitar que cada indivíduo integre-se à humanidade. Um trabalho dessa natureza requer capacidade de julgar o que precisa ser feito, o que é possível fazer e como fazê-lo nas condições concretas em que se desenvolve na sala de aula.
Portanto, ao invés de amordaçar os professores e investir contra a autonomia docente, os gestores prestariam maior contribuição à melhora da escola pública se apoiassem o seu desenvolvimento profissional, fortalecendo seus vínculos com a escola, os alunos, a profissão. Isso significaria organizar o sistema e as escolas para que ofereçam possibilidade de estudo e experimentação pedagógica voltadas para a atualização constante das referências ou bases político-pedagógicas que sustentam os modos de atuação docente.
Sônia Kramer diz que “ser autor significa dizer a própria palavra, cunhar nela sua marca pessoal e marcar-se a si e aos outros pela palavra dita, gritada, sonhada, grafada... Ser autor significa resgatar a possibilidade de “ser humano”, de agir coletivamente pelo que caracteriza e distingue os homens... Ser autor significa produzir com e para o outro...”.
Para serem autores do seu discurso os professores precisam construir mecanismos interiores que lhes permitam articular sua prática de modo coerente, não só com seus valores pessoais, mas também com os valores e necessidades construídas socialmente; precisam ter um domínio profundo do campo do conhecimento que irão ensinar, dos modos de ensiná-lo e dos alunos reais com quem irão trabalhar; precisam ter condições intelectuais e materiais para analisar individual e coletivamente o trabalho realizado; precisam ter recursos materiais e condições de espaço e tempo que permitam atender seus alunos de modos diferenciados e conduzi-los à aprendizagem efetiva; precisam também de reconhecimento e valorização profissional.
Estamos falando dos múltiplos aspectos que estão sendo, ano pós ano, subtraídos dos professores: formação de qualidade, condições adequadas de trabalho e valorização profissional.
Para serem autores do seu discurso os professores precisam construir mecanismos interiores que lhes permitam articular sua prática de modo coerente, não só com seus valores pessoais, mas também com os valores e necessidades construídas socialmente; precisam ter um domínio profundo do campo do conhecimento que irão ensinar, dos modos de ensiná-lo e dos alunos reais com quem irão trabalhar; precisam ter condições intelectuais e materiais para analisar individual e coletivamente o trabalho realizado; precisam ter recursos materiais e condições de espaço e tempo que permitam atender seus alunos de modos diferenciados e conduzi-los à aprendizagem efetiva; precisam também de reconhecimento e valorização profissional.
Estamos falando dos múltiplos aspectos que estão sendo, ano pós ano, subtraídos dos professores: formação de qualidade, condições adequadas de trabalho e valorização profissional.
Autoria do professor
Na medida em que esses aspectos estão sendo roubados dos professores, não só a possibilidade de falarem sobre o trabalho educativo, mas a própria possibilidade de serem autores de seu projeto de trabalho, das propostas que orientam a vida da sua escola está sendo igualmente subtraída. Também lhes está sendo roubada a idéia de pertencimento a uma categoria profissional, que deveria ser cada vez mais essencial, já que há um amplo e forte consenso a respeito da importância da educação escolar no mundo atual. Cada dia mais se esfacelam os vínculos entre os professores e a sociedade, bem como entre eles próprios.
Acabar com o silêncio dos professores requer mais do que lutar contra os cerceamentos formais à liberdade de expressão. Significa reorganizar a escola, as condições da docência e da formação dos professores. E para tanto a própria sociedade brasileira terá de se posicionar frente a uma importante questão: que educação quer para suas futuras gerações.
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